sábado, 3 de setembro de 2011

Reflexões sobre o RUMOS Itaú Encontros de Pesquisa – Etapa São Paulo

Abelardo e Mário de Ballentti
Considero, não só pela minha observação mas também pela conclusão a que chegaram os demais coletivos que o encontro de apresentação dos trabalhos seguido de debates foi uma etapa singular e que gerou outro produto de discussão.
O fato de ter que apresentarem ao grande grupo um recorte do que foi o processo, provocou muitas discussões inquietantes sobre o fazer artístico ou seja: Até que ponto este recorte poderia expressar a potencialidade da experiência vivida pelo encontro com o outro para o desenvolvimento de um trabalho colaborativo?
Ficou muito claro que a pesquisa desenvolvida levantou tantas perguntas sobre o fazer de cada um que não sabemos mencionar o tamanho do impacto destas discussões a curto, médio e longo prazo.
Para alguns grupos teatrais o hibridismo de conhecimentos resultado do projeto Rumos Itaú não pode ser avaliado na sua totalidade justamente porque este recorte do processo apresentado representa um momento de extrema ebulição de idéias que necessitam de tempo para serem maturadas.
Era visível nas apresentações ensaiadas a pressão interna gerada em alguns grupos para uma “boa performance” deste recorte a ser avaliado pelo grande grupo. Os debates sempre vieram com justificativas de que aquilo que estava sendo apresentado não expressava a riqueza dos encontros e que se tivessem que preparar algo novamente seria bem diferente do resultado exibido.
Outra questão que ficou bem evidenciada, não só pela ausência dos integrantes dos grupos durante as discussões, mas também pelo stress a que estão submetidos os grupos teatrais neste momento político e econômico do pais. O excesso de trabalho gerado pelas políticas públicas e leis de incentivo está interferindo de forma significativa no resultado dos trabalhos artísticos. Este tema apareceu não só nas discussões como também nas encenações apresentadas. Cito aqui o trabalho do coletivo do Grupo Espanca ( MG ) e Cia. Brasileira de Teatro (PR) com a proposta  Um Outro Si Mesmo – Troca de Pacotes.  Em cena a figura de duas produtoras carregando pastas, CDs e  um pacote de Fedex  contendo o material de pesquisa dos dois coletivos. Elas explicam ao público, de maneira formal, que chegaram a conclusão de queimar todo aquele material gerado pela troca de pacotes dos dois grupos. A cena provocou gargalhadas de toda platéia. O esquete seguiu apresentando diversas cenas atrapalhadas, tentativas falhas de apresentação de PowerPoint do processo do grupo, intercaladas a todo momento pelo estrondo dos acordes iniciais do hino nacional.
Esta apresentação expressou muito bem a situação caótica que estão vivendo os atores na busca da sobrevivência neste contexto sócio econômico onde estamos inseridos e acomodados.
A interação entre os coletivos durante a semana propiciou uma certa intimidade entre os iguais.  Aquela situação de que ao principio todos os grupos apresentariam um resultado “positivo” do projeto deixou espaço para revelações particulares do fazer de cada um, conflitos internos gerados pela convivência ( alguns grupos sequer conheciam o trabalho do parceiro convidado ) até os momentos de entrega total a proposta colaborativa, ao conhecimento que o encontro das diferenças pode gerar.
Um dos trabalhos mais emocionantes, não só pelo resultado apresentado ( recorte de pesquisa ) mas também pelo debate entre os dois coletivos e o grande grupo, foi  a pesquisa Conexão Música da Cena realizado pelos Clows de Shakespeare ( RN ) e Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz ( RS ). Aqui, eu saliento outro momento positivo do Encontros Itaú através da  discussão profunda de um tema, permeado por Seminário de Música na Cena apresentado em Porto Alegre com a participação de diversos músicos que compõem para teatro e tendo como participante o Grupo convidado de RN. O encontro gerou a edição da 10ª edição da Revista Cavalo Louco documentando os depoimentos do seminário. As cenas criadas em comunhão com sons e trilhas executadas pelos atores dos dois coletivos foram apresentadas nos dois estados antes de serem apresentadas no Itaú, resultando uma execução perfeita e emocionante.
Ao final tivemos uma palestra da pesquisadora Cecília Salles sobre Processos de Criação em Rede, Interações como Espaços de Possibilidades.  Ela abordou a questão  pertinente nos blogs dos coletivos: A manifestação clara da necessidade vital do trabalho colaborativo dos grupos teatrais. Citou vários autores, entre eles Edgar Morin, que abordam este intercambio das linguagens na arte contemporânea e a importância das relações intercambiáveis entre grupos para a geração de novos conhecimentos e desestabilização das verdades cristalizas. Foi abordado que a melhor maneira de criar novas idéias é justamente o confronto com idéias opostas ou não totalmente semelhantes. A criação cientifica nas sociedades contemporâneas está ocorrendo nos intercâmbios dos bares, nos intervalos dos seminários, nas conversas sobre filmes e poemas, fora dos gabinetes fechados. Vivemos um momento de conexão de idéias que geram outras idéias sem parar.
O último dia ( sábado, 03 set )  foi de avaliação do projeto com todos os participantes em grande plenária. Foram apresentadas várias frases postadas em todos os blogs. A Caixa do Elefante/ PeQuod foi citada já no inicio.
De maneira muito gentil e sensível os curadores abriram a discussão com a finalidade de ouvir os coletivos e avaliar formas de aprimorar o edital.
Pela avaliação de todos os participantes, foi muito positivo o encontro, também foi unanime a proposta de manter o projeto da maneira como foi realizado, resguardando a liberdade dos grupos de escolherem seus pares e temas a serem discutidos nos encontros, sem exaustivas prestações de contas e penadas contrapartidas, situação recorrente nos editais espalhados pelo pais.

                 Mário de Ballentti – Caixa do Elefante  - teatro de bonecos