A criatividade não suporta um lugar repetitivo
Nosso encontro de hoje retomou um pouco da história pessoal dos integrantes dos grupos, seguido da retomada de alguns temas tratados nos encontros anteriores.
No depoimento de Mário de Ballentti, o qual resgata suas paixões de infância como motivadores de seu trabalho artístico, percebe-se a descoberta da força do teatro como meio de expressão; o uso do teatro como recurso para comunicar. As suas experiências de infância influenciaram na escolha pela linguagem teatral com animação. Ele entende que essas paixões de infância motivam a criação, pois a criação é a expressão e a prática do estímulo recebido. O seu referencial visual e sonoro (como a Revista Recreio e os disquinhos do Braguinha e Radamés Gnattali) repercutem na escolha estética dos seus espetáculos. Para ele, as experiência boas, agradáveis, nos impelem à criação.
“Fazer da aula de artes um processo de expressão deve ser iniciado desde cedo. O início dos cursos que ministro parte da sensibilização com o material. Sentir o material compõe cinqüenta por cento da expressão (...) Construir e atuar são atividades que sempre surgiram juntas para mim: sempre foi preciso primeiro construir o brinquedo para depois brincar com ele. A montagem e a construção da brincadeira faz parte do brinquedo”
Acrescentando o conteúdo apreendido na sua participação no Festival Internazionale di Teatro e Cultura per La Prima Infanzia 2011 (Itália), no qual foram debatidas questões sobre a formação bio-social da criança, Mário de Ballentti comenta que o cérebro da criança produz relações neurais em muito maior quantidade do que o adulto, o que a faz perceber e expressar o mundo de outro modo, sem condicionamentos.
O grupo, então, discutiu e fez uma breve incursão e pesquisa no campo na neuroestética para ampliar nossa discussão e tentar compreender a experiência estética no âmbito neuronal. Alguns dados observados nessa breve pesquisa:
- Escutar música e perceber cores ativa processos motores no cérebro humano. Determinadas obras de arte produzem substâncias, como a dopamina, que provoca prazer, bem-estar e estimula a criatividade.
- Para a criança, a linha atenta para o limite e prepara para a percepção da forma. Neste ponto, retomamos a discussão tratada no encontro anterior, no qual comentamos sobre o movimento do desenho que o corpo do ator imprime no espaço e a qualidade “silhuetada” dessa forma como produtora de informações claras. A leitura da ação necessita da leitura da forma e da leitura que essa forma ocupa e transforma os vazios do espaço.
- O sistema meramente reprodutivo em arte inibe a criatividade e ser criativo hoje é uma necessidade imperativa dentro da articulação social do sujeito. Logo, o papel da arte como estimulante criativo, por si só, constitui toda uma pedagogia.
Voltando a refletir sobre alguns dos temas anteriormente discutidos:
- Liliane resgata a temática da autonomia do ator/autor: ele constrói, é participante, passa a compreender o entorno. Nessa perspectiva também, refletimos sobre o ator múltiplo, que se desdobra em inúmeras funções fora da cena, desde a construção, produção até a divulgação de seu trabalho e como isso interfere no seu processo criativo.
- Carlos comenta: “O entorno da gente mudou para que pudéssemos realizar o trabalho.” Assim, ele reflete sobre as estruturas de produção, sua profissionalização e especialização. Ele assevera que os projetos necessitam de mais consistência e faz-se mister a contratação de terceiros para preencher funções nas quais não somos especializados.
- Comentou-se sobre uma tendência de que, nos grandes centros econômicos, a produção artística muitas vezes desvia-se de seu rumo inicial, em função da política cultural adotada pelas instituições fomentadoras. Os editais ditam formatos para a elaboração de projetos, determinando valores agregados para estes projetos e verbas para a montagem e circulação. A evolução do grupo é determinada por uma necessidade mercadológica que exige uma produção constante de produtos culturais novos em detrimento a uma necessidade artística de produção de pesquisa.
O grupo reconhece que nesta iniciativa do Rumos Itaú, um projeto de fomento e incentivo à produção de conhecimento, altamente estimulante do ponto de vista criativo. Nesta semana de encontros, onde as duas companhias conviveram intensamente com o fim exclusivo de refletir sobre seus fazeres e suas inserções no panorama cultural do país, através de suas sistemáticas de produção, formação e criação, tivemos a oportunidade de aperfeiçoamento mútuo.
No final deste encontro, programamos a próxima etapa deste intercâmbio, que continuará no Rio de Janeiro...
Continuem acompanhando o blog e comentando... Nas próximas postagens incluiremos mais vídeos com os depoimentos dos participantes.